Precocidade.
Mark Zuckerberg é um multimilionário precoce e fazer um filme sobre ele também. Ao contrário de Steve Jobs e Bill Gates, que efectivamente mudaram o mundo, ao permitir a um vasto número de pessoas possuir um computador em suas casas, sendo esse o primeiro passo para a grande revolução tecnológica que permitiu a entrada da humanidade naquilo a que hoje se chama de Era da Informação ou Era Digital, Zuckerberg ou se quisermos o Facebook, não mudou nada, apenas monopolizou algo que já existia, as chamadas redes socias. Para além dos enervantes sintomas que esta febre acarreta, com todas as suas vantagens e desvantagens, o Facebook pouco ou nada acrescenta às possibilidades previamente existentes no que toca ao convivio social digital ou virtual. Desde os tempos do Mirc e das chatrooms, passando pelo Hi5, que as ligações humanas originadas através da internet, quer se trate de affairs, amizades, casamentos ou qualquer outra espécie de relacionamento entre individuos do planeta, já eram possíveis e igualmente eficazes. A maior diferença residirá talvez na crescente compulsividade com que certos individuos se vêm impelidos a partilhar o seu quotidiano e a sua intimidade, as suas ideias e movimentos, aniquilando por completo uma parte considerável da sua privacidade, algo cujo valor tem vindo a decrescer substancialmente na bolsa dos valores humanos, chegando mesmo a tornar-se enervante (na televisão encontram-se igualmente reflexos deste facto em abundância, nos reality shows, por exemplo). Outra das grandes inovações que chegou com o Facebook, foi a de transformar uma rede social num negócio de milhares de milhões de euros às custas dos seus utilizadores. Como tal, para além de um excelente negócio para o Sr. Zuckerberg e reconhecendo todo o seu mérito na estratégia que teve como ponto de partida a exclusividade e a apropriação hábil de um projecto alheio (o que até é perdoável pois toda a história da informática moderna é pautada por tal facto, desde os tempos de Jobs e Gates) o Facebook não veio de forma alguma revolucionar de forma relevante a vida de mais ninguém. Outra coisa coisa que me chateia é o facto de The Social Network, o tal filme que classifico de prematuro, e que conta toda esta (breve) história, ter sido realizado por David Fincher. O mesmo Fincher que realizou Alien 3, 7 Pecados Mortais, O Jogo, Clube de Combate e o O Estranho Caso de Benjamin Button. Embora 7 Pecados Mortais e O Jogo se destaquem claramente pela positiva em relação aos restantes, o facto é que Fincher nos habituou a um certo tipo de cinema, ao qual The Social Network não corresponde. Não é que o filme seja mau, não é. Mas também não é Fincher, do qual reconhecemos apenas as imagens dominadas pelos característicos e soturnos tons verdes e acastanhados, mais adequados aos ambientes onde se move o psicopata encarnado por Kevin Spacey ou o implacável alien vindo de outro planeta do que ao retrato da vida de um jovem nerd informático que estuda em Harvard. E mais uma vez, não é que não resulte e o filme não tenha o seu quê, só acho que não devia ter sido o Fincher a fazê-lo. Será que está no início do seu declínio? À semelhança dos seus congéneres que, entre o final dos anos 70 e o princípio dos anos 80, realizaram obras simplesmente geniais e depois se fundiram com essa massa anónima de gente que faz filmes para os grandes estúdios de Hollywood, desses que ao fim de uns dias ninguém se lembra? Casos gritantes como Ridley Scott ou Francis Ford Coppola? Será que até no aspecto da decadência este filme é um sinónimo de precocidade?